Pesquisa do ICe contribui com o entendimento sobre o zumbido

Cerca de 20% da população mundial (28 milhões de pessoas só no Brasil) sofre com zumbido ou com algum grau de deficiência auditiva, de acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS). Embora não seja classificado como doença, mas um sinal de alerta de perda auditiva, o zumbido prejudica muito a qualidade de vida das pessoas que convivem com ele. Na UFRN, o Instituto do Cérebro tem um laboratório dedicado ao estudo da audição e atividade neuronal, um espaço onde o zumbido é investigado com afinco. O trabalho “Decreasing dorsal cochlear nucleus activity ameliorates noise-induced tinnitus perception in mice” (“A diminuição da atividade do núcleo coclear dorsal melhora a percepção do zumbido induzido por ruído em camundongos”, em tradução livre), publicado recentemente na BMC Biology, trouxe avanços para a compreensão desse distúrbio.

O artigo, assinado pelos doutorandos Thawann Malfatti e Barbara Ciralli, sob orientação da professora Katarina Leão, reporta a descoberta de que um subgrupo de neurônios, localizados numa região chamada Núcleo Coclear Dorsal (DCN, em inglês), está envolvido na percepção de zumbido. “O DCN é uma das primeiras estruturas no cérebro a processar o som que escutamos. É responsável principalmente por extrair as informações necessárias para reconhecermos características de frequência dos sons. Sabe-se que o DCN está afetado no zumbido causado por exposição excessiva ao ruído, porém, por ser uma área com diversos tipos diferentes de neurônios e funções, ainda não se sabe ao certo quais são as conexões de fato alteradas no zumbido”, resumem os pesquisadores.

Barbara Ciralli e Thawann Malfatti (foto: Katarina Leão)

Devido à complexidade dos experimentos realizados, o estudo levou cinco anos para ser concluído e é a publicação principal do doutorado de Thawann. Ele explica que, em razão das técnicas utilizadas serem invasivas, dificilmente podem ser aplicadas diretamente em humanos. Além disso, o experimento necessita controlar variáveis que são difíceis de monitorar em pacientes. Por isso, a investigação ocorreu em camundongos. Como os animais não podem falar se estão ou não com zumbido, foram aplicados testes de comportamento para verificar a ocorrência do sinal. 

Neste modelo experimental, eles foram induzidos ao zumbido sem perda auditiva e, divididos em dois grupos, tiveram os neurônios da região do núcleo coclear dorsal desativados em momentos diferentes. Em um grupo, essa desativação foi feita durante a indução; em outro grupo, após. A ideia era verificar se o animal apresentava uma melhor resposta no teste do zumbido, assim como checar se é possível preveni-lo. “Descobrimos que, ao desativar esse subgrupo de neurônios durante o teste de zumbido, os animais apresentam uma melhora no teste, o que indica que o zumbido diminui. Além disso, observamos que diminuir a atividade desses mesmos neurônios durante a indução do zumbido não previne o seu surgimento. Logo, esse subgrupo de neurônios do DCN parece ter um papel importante na manutenção do zumbido e não na sua geração”, descrevem Thawann e Barbara.

Imagem: wayhomestudio para freepik

Embora a descoberta não se apresente na forma de solução, ela indica caminhos importantes para a compreensão do distúrbio. “Ao entender como a atividade de subgrupos específicos de neurônios está alterada no zumbido, estamos dando mais um passo na direção de um tratamento mais direcionado e efetivo. No futuro, quando todo o mecanismo de geração e manutenção do zumbido for esclarecido, poderá-se produzir novas alternativas terapêuticas, direcionadas especificamente para as reverter as alterações causadas pelo zumbido”, estimam Thawann e Barbara.
O artigo na íntegra está disponível na página do Biomed Central, uma editora científica britânica de acesso aberto e com alto fator de impacto – medida que avalia a importância de uma publicação com base no número de citações de seus artigos científicos. Fundada em 2000, a Biomed Central integra, desde 2008, o grupo Springer Nature e engloba dezenas de periódicos especializados. Um deles, o BMC Biology, onde o artigo de Thawann e Barbara foi publicado, é um dos que possuem maior fator de impacto, ao lado do BMC Medicine.